quarta-feira, maio 21, 2025

antônimos (videopoema)

Produzi antônimos como uma das atividades do componente eletivo "Experimentações poéticas do sensível", ministrado pelo professor e amigo antonio carlos sobrinho (a quem entrevistei aqui), no semestre 2024.1 da Licenciatura em Letras da Universidade Federal de Alagoas (Ufal). Sob ritmo intenso, a cada aula éramos incitados a elaborar objetos poéticos a partir de propostas criativas e desafiadoras. Os resultados eram socializados e posteriormente discutidos.

Como sugere o título experimentações, a ideia era a de que saíssemos da zona de conforto e experimentássemos outros tipos de suporte, aproveitamento dos espaços, estratégias narrativas e técnicas de escrita. A oportunidade me inspirou a ampliar os processos criativos unindo artes que comumente produzo de forma isolada, como o poema e o bordado, e a explorar o audiovisual e o canto, com os quais tinha pouca ou nenhuma experiência.

O vídeopoema foi concebido a partir das leituras sugeridas, das discussões levantadas em sala de aula, das contribuições de colegas de turma e do meu próprio universo poético. Ao final, ele foi selecionado, junto a outros dois poemas de minha autoria, para compor a coletânea Experimentações poéticas do sensível: livro de artista, organizada pelo antonio, com 45 textos de 30 discentes. A publicação pode ser acessada, baixada e/ou lida na íntegra no blog da eletiva. Lá também estão registrados um panorama geral da proposta e relatos de algumas pessoas sobre como foi a experiência na disciplina.

Deixo aqui o videopoema seguido do texto.



Adélia lê sob a bananeira: “Roxo aperta. / Roxo é travoso e estreito. / Roxo é cordis, vexatório.” e roxa é a glande cansada do homem à esquerda, pulsando a 120 cavalos. por que a tarefa de amá-lo? pergunto ensimesmado, sei que de ti nada além silêncio. por que tão difícil? por que dar corpo a austera missão? por que me leva sonho, arte, e mesmo as dores já não são minhas? por que as únicas mulheres passíveis de amor sejam três, uma delas fardo e frágil? para que tanto ressentimento? por que me ilibam essência amadeirada e loção pós-barba em pleno meio-dia no 113 lotado? por que este homem abre seus poros, ejacula 3 vezes seguidas dentro de mim, deita e dorme de costas, e eu cartografo infiltrações no teto e alergias com pouquíssimo conhecimento geográfico? ou como o aquarista mede níveis nas laterais, deslizando dedos massudos sobre vidro temperado? à noite minha boca arde quando penso os calos nas mãos dele, ríspidos, como me disse de sua língua, e, zelosa, desejo arrancar a pele grossa com os dentes. sanar febre sárdio, jaspe e papoula semiaberta. o mundo silenciou desde o “faça-se a luz!”, pois antes veio o homem neste jogo estátua de sal, mas é igualmente verdade o quanto mudou: há objetos interessantíssimos, aparelhos depilatórios cor-de-rosa — “Venus”, que certamente se via às voltas com pelos nas pernas —; tampões o.b., para estancar sangramento nasal. mas ainda são homens os que, sequer meu nome ou a textura do vão entre minhas coxas em suas bocas, especulam desejo e momento exatos para me pendurar em lustres — há estrelas demais neste céu diminuto; são homens os que nomeiam sentimento, os que me chamam louca, os que me tiram a roupa desde pequeno, por vezes contra vontade, e todos os dias desde então. “faça-se a luz!” e por que deveria? mal me esperam deitar para pôr em uso o imperativo. por que me fez presa à tua imagem e semelhança sem saber se o queria? mártir e santa em gozo místico — por isso me prostra diante homens de vocabulário enfadonho, tão repetitivo? por que insuportável a dor da tua presença e, apesar disso, estas palavras se moldam para comportá-la?

— Hyago Marques

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